06/08/2018
CRESSRS, em parceria com o Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente e o Conselho Regional de Psicologia do Rio Grande do Sul, lança nota de repúdio ao projeto de Lei do Estatuto da Adoção e convida categoria profissional e interessados/as em geral para participação em audiência pública sobre o tema.
por Assessoria de Comunicação CRESSRS
Os debates coletivos sobre o projeto de Lei do Estatuto da Adoção, realizados nos últimos meses pelo Conselho Regional de Serviço Social/RS (CRESSRS), o Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (CEDICA) e o Conselho Regional de Psicologia do Rio Grande do Sul (CRP/RS), resultaram na solicitação de uma audiência pública à Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul (ALRS). O objetivo das três entidades, que manifestaram-se publicamente contra o projeto de Lei através de nota de repúdio, é ampliar a discussão do assunto junto à sociedade civil. A solicitação foi apreciada e votada favoravelmente na ALRS, e a audiência pública está agendada para o próximo dia 13 de agosto com o tema "Proposta de Lei do Estatuto da Adoção: Debates entre a Garantia e Violação à Convivência Familiar e Comunitária de Crianças e Adolescentes no Brasil". As categorias profissionais e interessados/as em geral estão convidados/as para participação.
Confira mais informações no evento da audiência pública no Facebook.
Abaixo, segue a íntegra da nota de repúdio.
Nota de repúdio à proposta de Estatuto da Adoção
O Conselho Regional de Serviço Social (CRESS RS), juntamente com Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente do Rio Grande do Sul (CEDICA/RS) e com o Conselho Regional de Psicologia (CRP RS) vem por meio deste documento manifestar sua rejeição integral ao Projeto de Lei do Senado nº 394 de 2017 conhecido como "Estatuto da Adoção", mediante uma análise objetiva sobre seu conteúdo.
A partir da Constituição Federal de 1988, empreendeu-se no Brasil grande mobilização social, organização e luta, para a elaboração e aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. Este processo foi resultado da participação de diversos atores, inclusive crianças e adolescentes que, por meio de fóruns, seminários e outros espaços de discussão, manifestaram seu desejo por um novo projeto de sociedade pautado na proteção integral e na garantia da efetivação dos direitos da criança e do adolescente.
Há que se considerar, ainda, que o ECA é pesquisado como referência para outros países e, portanto, o mais importante nesse momento é envidar esforços políticos para que se cumpram planos e normativas nele contidos. Trata-se, portanto, de uma conquista histórica, mas que ainda carece de investimentos para sua plena implementação, tendo em vista a falta de recursos públicos, a fragilidade do Sistema de Garantia de Direitos, as carências na formação dos trabalhadores da área e a cultura da institucionalização.
A legislação vigente reconhece a família como o locus privilegiado do afeto e do desenvolvimento humano. Compreende que a família natural é composta pela família nuclear e extensa, sendo, portanto, prioritária as ações que previnam rupturas, fortaleçam ou restabeleçam vínculos. Sendo assim, o Projeto de Lei nº 394/2017 rompe com os princípios estatutários ditados pela doutrina da proteção integral ao priorizar a adoção em detrimento da família de origem.
Frente a isso e diante da falta de políticas sociais, da precarização dos serviços e do trabalho profissional na área, da desigualdade social no país e da crescente pobreza da população, entendemos que a adoção desvinculada das demais medidas de proteção significa um retrocesso nos direitos fundamentais da criança e adolescente. Ainda, expressa claramente um recorte socioeconômico ao culpabilizar as famílias pela situação de vulnerabilidade que vivenciam.
Da mesma forma, o referido Projeto de Lei, ao possibilitar a intervenção de particulares em medidas de responsabilidade da autoridade judiciária, desconsidera a necessidade de profissionais especializados na temática devido as peculiaridades de uma filiação adotiva. Isso reaviva práticas menoristas e, de alguma forma, transforma crianças e adolescentes em objetos de propriedade dos pais e do Estado, que delas podem dispor de acordo com interesses das pessoas adultas.
Cabe ressaltar a existência de inúmeras crianças e adolescentes disponíveis para adoção, há longo período, tendo em vista a divergência entre esses e o perfil desejado pelos habilitados. Crianças e adolescentes com dez anos ou mais de idade, grupo de irmãos e/ou situações complexas de saúde encontram extrema dificuldade para adoção devido ao baixo índice de pretendentes interessados. Esclarecemos que, das 621 crianças e adolescentes que permanecem disponíveis para adoção no RS, 91% tem dez anos ou mais de idade mediante um universo de 5.650 habilitados neste mesmo território.
Neste contexto, a proposta do “Estatuto da Adoção” se calca em frágeis argumentos, sem fundamentações científicas que possam corroborar as propostas apresentadas. A plena efetivação do direito à convivência familiar demanda a implementação de políticas públicas intersetoriais focadas nas famílias, garantindo-se o direito à proteção do Estado, por meio de programas e serviços especializados.
A pretensa "Adoção intuito personae", descrita no referido PL, poderia gerar um descrédito para o Cadastro Nacional de Adoção, além de que ensejaria o comércio e o tráfico de crianças, dando assim margem práticas ilícitas. Apoiar a adoção como medida necessária e importante, não significa retirar o valor da proteção à família de origem, inclusive para filiação adotiva ter plena legitimidade. Tais assertivas levam ao entendimento de que a criação de outra legislação, como pretende o Projeto de Lei n° 394/2017, não sanará as presentes dificuldades da população de crianças e adolescentes.
Diante desses argumentos, o Conselho Regional de Serviço Social (CRESS RS), o Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente do Rio Grande do Sul (CEDICA/RS) e o Conselho Regional de Psicologia (CRP RS) vem a público repudiar o Projeto de Lei do Senado nº 394 de 2017 conhecido como "Estatuto da Adoção", uma vez que o presente projeto não cria possibilidades de materializar os direitos de crianças e adolescentes, mas pode acarretar na violação de diretos construídos historicamente. Reafirmamos que defender os direitos de crianças e adolescentes se faz na qualificação de políticas públicas universais e intersetoriais.
Conselho Regional de Serviço Social (CRESS RS)
Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente do Rio Grande do Sul (CEDICA/RS)
Conselho Regional de Psicologia (CRP RS)
Foto: Assessoria de Comunicação ALRS.