04/09/2016
O encontro contou com cerca de 50 assistentes sociais, entre residentes e preceptores, para debater “A residência multiprofissional no contexto de precarização da política de saúde e educação”.
por Assessoria de Comunicação do CRESS
Porto Alegre, 18 de agosto de 2016.
O Encontro Preparatório para o Seminário Nacional sobre Residência em Saúde e Serviço Social realizado em Porto Alegre no dia 18 de agosto de 2016, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) - promovido pelo GT-Saúde do Conselho Regional de Serviço Social (CRESS) 10ª região em parceria com o curso de Serviço Social da UFRGS – teve como objetivo aprofundar a discussão sobre o trabalho e formação dos assistentes sociais nas Residências em Saúde, ampliando espaço de articulação e debate sobre esta temática, a qual vem sendo pautada sistematicamente no referido GT-Saúde e em encontros estaduais anteriores[1]. O encontro contou com a participação de: assistentes sociais residentes, preceptores, tutores e coordenadores de programas de Residência do Rio Grande do Sul[2]; representantes do CRESS 10ª região, vice-presidência da Associação Brasileira de Ensino em Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS) Sul I.
Aprovamos esta carta tendo em vista a socialização das discussões e estratégias traçadas coletivamente pelo coletivo gaúcho. Defendemos uma formação crítica nas Residências em Saúde, sustentada na direção social e princípios da Reforma Sanitária Brasileira (RSB), da Reforma Psiquiátrica (RPsi) e do Projeto Ético-Político do Serviço Social (PEP), numa conjuntura social regressiva e conservadora, de agudização dos ataques privatistas ao Sistema Único de Saúde (SUS), a qual atinge a própria democracia e direitos conquistados pela sociedade brasileira. Neste quadro, destacamos que a qualificação da formação nas Residências entrelaça-se com a luta social em defesa do SUS e das RSB e RPsi, tendo em vista o fortalecimento de uma política de formação de trabalhadores em saúde que considere os desafios de consolidação deste Sistema e as necessidades e diretos sociais da população brasileira, portanto, construída de forma coletiva e democrática.
Ressaltamos dois eixos estratégicos da articulação e atuação política dos assistentes sociais no âmbito das Residências em Saúde: as lutas em defesa do SUS e de condições adequadas para o desenvolvimento do ensino em serviço, formação teórica e pesquisa nas Residências; a qualificação dos pressupostos político-pedagógicos que estruturam a formação em Residência, considerando tanto os saberes e práticas do campo comum entre as profissões como o núcleo de Serviço Social.
No tange ao primeiro eixo, ressaltamos a importância do fortalecimento de movimentos, fóruns e frentes em saúde em defesa do SUS e da RSB e RPsi, opondo-se aos processos de desmonte, privatização e precarização dos serviços de saúde, os quais afetam diretamente os processos de ensino e trabalho nas Residências. É essencial potencializar a participação dos assistentes sociais nos diferentes espaços de controle social bem como na articulação de grupos de trabalho ou fóruns voltados para a discussão das Residências em Saúde, agregando residentes, preceptores, tutores e coordenadores de Programas. Trata-se de estratégia central para a efetivação de uma construção coletiva e democrática de políticas e processos decisórios relacionados às Residências em Saúde em âmbito nacional - considerando a Comissão Nacional de Residência Multiprofissional em Saúde, o processo de avaliação e certificação, incluindo o reconhecimento desta titulação em concursos públicos para o SUS - bem como a gestão participativa dos Programas em suas instâncias colegiadas locais.
A partir dos depoimentos e grupos de trabalho realizados no Encontro, destacamos alguns desafios quanto às condições adequadas que garantam a qualidade dos processos ensino e trabalho nas Residências, quais sejam: redução da carga horária dos residentes de 60hs para 44hs semanais, tendo em vista uma formação crítica e reflexiva; fortalecimento da gestão democrática dos serviços de saúde que são cenários de prática, superando relações hierárquicas que tem impactado em processos de assédio moral e adoecimentos dos trabalhadores, especialmente dos residentes; garantia de cenários de prática que possuem composição adequada de equipes, tendo em vista superar a atuação do residente voltada para suprir a defasagem dos quadros funcionais; efetivação da distribuição das carga horária da formação em atividades teóricas (20%), práticas e teórico-práticas (80%), abarcando diferentes experiências formativas, tais como atividades assistência, planejamento e pesquisa em saúde, participação em eventos, grupos de pesquisa, reuniões de representação, inserção em espaços de controle social, participação popular e movimentos sociais, reuniões de equipe; garantia de educação permanente para preceptores e tutores para a atuação na Residência; reconhecimento da atividade de preceptoria e tutoria na carga horária dos trabalhadores e docentes, respaldada em mecanismos de progressão funcional e em planos de carreira; pactuação e preparação prévia das equipes que receberão residentes, superando relações verticais na implantação do Programas; garantia de cenários de prática que possuam coerência e alinhamento com a RSB e RPsi, considerando a realidade de serviços mantidos por parceria “público-privada” e hospitais psiquiátricos que compõem os programas de Residência.
No que tange a qualificação dos pressupostos político-pedagógicos, compreendemos que a Residência constitui-se numa formação no e pelo trabalho em saúde orientada pela direção sócio-política da RSB, RPsi e PEP. Esta formação visa, de forma articulada, a qualificação de competências interprofissionais na atuação em equipe (campo) e as competências e atribuições de cada profissão (núcleo). Pauta-se na autonomia e protagonismo dos residentes, como um trabalhador em formação, que conte com suporte teórico-prático para o diálogo, reflexão crítica, potencializando sua atuação na defesa do SUS e na construção de estratégias para a qualificação da atenção em saúde, com base nas realidades e necessidades loco-regionais.
Sobre o ensino em serviço, ressaltamos como desafio a garantia de itinerários diversificados de formação dos assistentes sociais, contemplando a vivência da rede do SUS, o desenvolvimento de ações assistenciais, de planejamento/gestão, ações de controle social na saúde e em demais políticas, fortalecimento a intersetorialidade, tais como: inserção em conselhos, fóruns, movimentos, ações educativas de mobilização e participação popular. É importante a atuação dos assistentes sociais no sentido de garantir a institucionalidade deste eixo de formação nos projetos político-pedagógicos, o que não vem acontecendo de forma efetiva em todos programas de Residência. Destacamos a necessidade de fomentar a organização de experiências de ensino em serviço que contem com suporte teórico, articuladas com matrizes curriculares que problematizem a realidade vivenciada nos serviços de saúde, considerando o protagonismo dos residentes e preceptores neste processo. Neste horizontes destacamos como questões centrais: o suporte para o exercício da preceptoria, através de espaços de educação permanente constituídos para esta finalidade, contemplando a atuação do assistente social no SUS e a área de concentração do Programa; o aprofundamento dos fundamentos teórico-metodológicos da preceptoria, considerando a particularidade da mesma como uma supervisão de trabalhadores em formação; o desenvolvimento de processos de avaliação do trabalho e ensino nas Residências participativos nas equipes dos serviços, não centrados exclusivamente nos Residentes. Ressaltamos a importância da valorização e reconhecimento dos serviços de saúde no protagonismo histórico da constituição dos Programas de Residência em Saúde, tendo em vista a trajetória de instituições que não desenvolvem Residência em conjunto com Instituições de Ensino Superior (IES).
No que tange a formação teórica e teórico-prática nas Residências, enfatizamos que a mesma necessita ser organizada a partir dos pressupostos da educação permanente, tendo a análise e reflexão do trabalho em saúde como eixo articulador, tanto nos espaços multiprofissionais como de núcleo do Serviço Social. Contudo, verificamos ainda no cotidiano das Residências espaços teóricos dissociados da realidade dos serviços, com ênfase em conteúdos técnicos e sem debate político sobre a conjuntura do SUS. Neste quadro, é estratégica a atuação dos assistentes sociais no sentido de contribuir com a abordagem da RSB, da determinação social do processo saúde-doença, da participação popular e controle social como eixos fundantes da inserção crítica e propositiva da profissão no SUS, garantindo estes conteúdos nos espaços de formação teórica e teórico-prática das Residências, independentemente da área de concentração dos Programas. Destacamos ainda a importância de maior debate sobre os fundamentos teórico-metodológicos da tutoria considerando uma concepção de educação crítica que permita a reflexão e crítica do trabalho em saúde, juntamente com o reconhecimento destas atividades de ensino pelas universidades. Salientamos a importância de que a integração entre as IES e serviços de saúde seja desenvolvida a partir de processos de diálogo que a particularidade e contexto destes serviços, dos saberes e práticas acumulados pelos trabalhadores da saúde, tendo em vista o desenvolvimento integrado de ações de educação permanente e pesquisa.
Sobre a dimensão da pesquisa na formação em Residência, ressaltamos que a mesma é fundamental para adensar a dimensão reflexiva e crítica do trabalho, ao mesmo tempo que volta-se para a qualificação da atenção em saúde. Portanto, é necessária a garantia de carga horária semanal dos residentes para estas atividades juntamente com o processo de orientação e suporte de preceptores e tutores para o desenvolvimento das mesmas. Há de considerar a importância de ampliar espaços e meios de divulgação das pesquisas, tais como seminários e publicações das produções oriundas dos programas de Residência.
No que tange à particularidade da atuação dos assistentes sociais nas Residências, salientamos a importância de uma maior ênfase para os Fundamentos do Serviço Social, pois os mesmos perpassam transversalmente o ensino em serviço e a formação teórica e teórico-prática. É a densidade de apropriação dos Fundamentos do Serviço Social no processo de formação da Residência que permite uma inserção crítica e propositiva nas ações e discussões teóricas multiprofissionais, bem como a qualificação das competências e atribuições privativas dos assistentes sociais na saúde.
Tendo em vista o fortalecimento da discussão sobre as Residências em Saúde, aprovamos a constituição do “Núcleo de Serviço Social, Formação e Residências em Saúde”, criado através de parceria entre docentes do curso de Serviço Social da UFRGS e GT-Saúde do CRESS, contando com coordenação e composição colegiada através de representação das entidades da categoria e de assistentes sociais residentes, preceptores, tutores e coordenadores de programas, conforme indicação do plenário[3]. O Núcleo tem como atribuições iniciais o desenvolvimento de pesquisa sobre a inserção do Serviço Social nas Residências no RS e sobre a realidade dos assistentes sociais egressos dos Programas, juntamente com a promoção sistemática de eventos de articulação política e debate sobre o tema. Apontamos a relevância de que cada estado, junto aos CRESS e ABEPSS, constitua coletivos de debate sobre este tema, tendo em vista a estratégia de aglutinação dos mesmos num Fórum ou Grupo Nacional de Serviço Social e Residências em Saúde, com encontros sistemáticos e atribuição de realização de pesquisas e estudos sobre o tema, com ênfase para os pressupostos político-pedagógicos da formação e articulação de lutas pela qualidade da formação em saúde.
Por fim, destacamos a necessidade de mobilização e atuação dos segmentos envolvidos nas Residências em lutas mais amplas, na defesa de um SUS 100% público, estatal, universal, gratuito, de qualidade, com ampla participação popular. Manifestamos a nossa posição contrária ao atual Ministro da Saúde Ricardo Barros e ao presidente interino Michel Temer, bem como a qualquer governo que atue no desmonte das políticas de Seguridade Social. Somos contrários à agenda neoliberal de contrarreformas que em favor do capital destitui direitos da classe trabalhadora, processo expresso por meio das terceirizações, privatizações e precarização do Sistema Único de Saúde e demais políticas sociais.
SAÚDE E EDUCAÇÃO NÃO SÃO MERCADORIAS!
NOSSA LUTA É TODO DIA!
[1] Encontros estaduais realizados pelo CRESS 10ª Região no ano de 2011 e 2015.
[2] O evento foi organizado através do convite aos 13 programas existentes no RS que contam com a inserção do Serviço Social. Estiverem presentes 55 participantes oriundos de 9 programas (Escola de Saúde Pública do RS, Grupo Hospitalar Conceição, Hospital de Clínicas de Porto Alegre-UFRGS, Hospital São Lucas-PUCRS, Educa Saúde – UFRGS-SMS, ULBRA, UFSM, UNIFRA, Hospital de Pronto Socorro/IPA).
[3] Docentes Thaisa Teixeira Closs (UFRGS) e Vanessa Maria Panozzo Brandão (UFRGS); residentes Graciele Silva de Matos (UNIFRA), Sharon Farias dos Santos e Taiane Ferreira (Hospital de Pronto Socorro/IPA), Camila Reinheimer (Escola de Saúde Pública do RS), Gabriela Dutra Cristiano, Patrícia Fanton e João Lunardi (Grupo Hospitalar Conceição); preceptoras Cristine Kuss (Hospital Pronto Socorro) e Lúcia Silveira (Serviço de Saúde Comunitária – Grupo Hospitalar Conceição); tutora Clarete Nespolo de David (Escola de Saúde Pública do RS), coordenadoras de programas Edelves Rodrigues (Residências Integradas do Grupo Hospitalar Conceição) e Alice Falcão Pereira (Residência em Saúde da Criança do Hospital Materno Infantil Presidente Vargas – Educa Saúde-UFRGS), representantes GT-Saúde e Comissão de Formação do CRESS 10ª região e ABEPSS Sul I (a serem indicados pelas entidades).
Foto: Katia Marko